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[PROSA_Oficina de textos_UFMG 2011] Salinha para resolução de questões abertas de Literatura (vestibular UFMG 2011) . Informações: emaildoaloisio@yahoo.com.br

7 de dezembro de 2007

O rei da vela (Oswald de Andrade)

O rei da vela (Oswald de Andrade)

Publicação: escrita em 1933 (quebra da bolsa de valores, crise internacional, decadência da aristocracia cafeeira paulista), publicação em 1937 e encenação em 1967 (ditadura)

Peça teatral concebida segundo os princípios do modernismo:

1) visão desmistificadora do Brasil

2) paródia e uso constante da ironia

3) personagens caricaturais

4) em lugar do culto ao passado, o gosto demolidor de todos os valores, sobretudo os burgueses

5) renega-se o tradicionalismo cênico, em busca de soluções cênicas metalingüísticas

6) espírito iconoclasta: forte teor satírico

7) carnavalização do Brasil colonizado e dependente do capital norte-americano : análise marxista

  • Paródia do caso amoroso entre Abelardo e Heloísa, casal trágico do séc.XIX

(http://www.casadobruxo.com.br/textos/abelardo.htm)

subtrai-se a paixão e proclama-se que o matrimônio é um negócio

  • Abelardo: arrivista (explorador, ganacioso) que lucra com dias atividades discutíveis, a agiotagem e a fabricação de velas

  • Família do Coronel Belarmino, cheia de taras, encarna a idéia caricata do desregramento sexual dos ricos

  • Apesar do sócio de Abelardo I, Abelardo II, se proclamar socialista, este não tem nenhuma consistência ideológica

“A polícia ainda existe...”/ “para defender os capitalistas”

“Só se pode prosperar à custa de muita desgraça.”

“Os latifúndios paulistas se reconstituem sob novos proprietários.”

“Heloísa será sempre de Abelardo. É clássico.”

JAULA: endividamento, aprisionamento dos devedores numa situação precária, dominação do capitalista

DENÚNCIA DA COMPRA DE BRASÕES: falência da elite paulistana, que vive de aparências

INTELECTUAL: lacaio que deve servir à burguesia, por isso escreve biografias neutras glorificando personagens da alta classe (Pinote)

VELA: retrocesso econômico, degradação moral da burguesia, decadência da aristocracia

Ex: Heloísa e o Americano aparentam ter um caso; Abelardo e D.Cesariana, mãe de Heloísa, flertam; D.Poloca e sua pose de fidalga virgem

  • Defesa do casamento burguês como maneira de manter a fortuna através da herança

1° ATO

Enfoque na exploração empreendida por Abelardo I e no desespero dos pedintes e devedores; trabalho = escritório de usura

2° ATO

Reunião familiar, relações de conveniência e crítica aos vícios da alta classe; lazer = ilha tropical na baía de guanabara, com a bandeira dos EUA

3° ATO

Falência, suicídio de Abelardo I e perpetuação da exploração através do seu alter-ego Abelardo II

Enquanto não se romper o estatuto colonial, e não se dar vez ao proletário, o Brasil será explorado por capitalistas.

Teatro de tese : cosnciência ideológica marxista do autor

  • A peça desvenda alguns recursos cênicos e dialoga com o espectador, para que o público tome partido diante das situações propostas

24 de novembro de 2007

Aula_Clara dos Anjos (Lima Barreto)

Clara dos Anjos (Lima Barreto)

Prof. aloisio

  • Pré-Modernismo: os autores ainda estão presos à estética e aos modelos do Realismo/Naturalismo, mas se introduz duas novidades:
    1. Realismo (universalizante) → Pré-Modernismo (interesse pela realidade brasileira) → Obras de nítido caráter de denúncia social. Lima Barreto, especificamente, faz uma análise das populações suburbanas do Rio de Janeiro.
    2. Busca de uma linguagem mais simples e coloquial: Barreto escreve com simplicidade, transcreve, muitas vezes, fielmente o modo de falar dos marginalizados e suas expressões típicas (influência para os Modernistas).
  • Características gerais da obra:
    1. simplicidade de linguagem
    2. aproximação com a fala cotidiana
    3. ironia
    4. moralismo explícito
    5. tom panfletário: denúncia do preconceito contra negros e mulatos
  • Figura de Clara dos Anjos: argumento vivo para embasar a denúncia da discriminação em relação aos suburbanos, os malefícios da alienação feminina, os problemas causados pela criação familiar super-protetora, a degradação a que os negros e mulatos se submetem devido à insensibilidade dos brancos.
  • Fatalismo → generalização → caráter alegórico da figura de Clara dos Anjos
  • O narrador interrompe a narração seguidas vezes para a fixação de tipos individuais suburbanos : matéria-prima da narrativa
  • Epígrafe do livro: caráter histórico do abuso sexual contra as mulheres de cor → tragicidade, fatalismo, imutabilidade de um comportamento social condenável→ visão pessimista

Roteiro de leitura

· Joaquim dos Anjos, pai de Clara: “simplicidade de nascimento, origem e condição”

· Retrato crítico e sarcástico dos subúrbio: presença dos “bíblias”, os protestantes, que chegam até o subúrbio e arrebanham os menos favorecidos, que anseiam por algum tipo de escape da realidade cruel em que vivem. Há uma ironia em relação ao sincretismo religioso, pois os fiéis buscam alívio e conforto em outras religiões, mas não deixam de batizar seus filhos na igreja católica.

· Clara dos Anjos: garota com dezessete anos e uma criação recatada e super-protetora

· Marramaque: semi-paralítico de alguma instrução intelectual

· Lafões: guarda de obras públicas, português de nascimento, de maneiras simples, que irá introduzir a figura do “mestre do violão e da modinha”, Cassi Jones

· Cassi Jones: o insensível deflorador de virgens, é descrito de forma agressiva e sarcástica pelo narrador, que sempre ressalta sua falsidade e suas artimanhas para conquistar as virgens indefesas, sempre garotas suburbanas, negras e mulatas

· Mãe de Cassi: preconceituosa, defende e ignora as proezas do filho, para que ele não se case com uma analfabeta ou costureira mulata.

· O pai de Cassi repugna-lhe totalmente e, mais adiante na narrativa, expulsará o filho de casa.

· Caso de Nair, que vinha receber lições de música com a irmã de Cassi. Ele a seduziu com uma carta reproduzida de um modelo desse tipo de missiva, tomada de um poema de Leonardo Flores, poeta beberrão.

· Nair é seduzida, engravida, sua mãe se suicida com lisol, o que é noticiado em todos os jornais. A má fama de Cassi espalha-se.

· O narrador, além de construir a imagem de Cassi como um sedutor insensível, ironiza seus métodos de conquista ao transcrever trechos de sua carta mentirosa, com a ortografia errada e o uso de clichês românticos.

· Crítica ao Amor como escape para as mulheres do subúrbio, sem perspectivas de vida.

· Narrador considera Marramaque um homem capaz de julgar Cassi, devido a sua convivência com literatos, poetas e escritores.

· A visão de Marramaque sobre os marginalizados é sempre corroborada pelo narrador.

· Clara cresce mal-acostumada ao “simplório sentimentalismo amoroso” das músicas populares.

· Joaquim dos Anjos permite que Cassi venha tocar no aniversário da filha. Ao chegar, ele causa alvoroço nas moças.

· Crítica à inaptidão de Cassi e seus trejeitos ensaiados de conquistador, como o fato de revirar os olhos dramaticamente quando dedilha, de maneira tosca, seu violão.

· Engrácia, mãe de Clara, finalmente se manifesta e diz ter achado indecente a forma de Cassi tocar, e decide proibir que o moço venha em sua casa novamente, para desespero de Clara.

· Crítica a Engrácia, que recebera boa instrução, e esquecera o que tinha estudado depois de casada.

· Crítica às modinhas e ao idealismo romântico forjado por elas no espírito de Clara = alienação feminina.

· Cassi retorna à casa de Clara, mas é recebido com frieza por Joaquim

· Papéis e documentos sobre as “atuações” de Cassi circulavam nas mãos de delegados na forma de um caderno

· Descrição detalhada da pobreza suburbana

· Descrição naturalista = coexistência de uma visão, ao mesmo tempo, irônica e solidária em relação ao suburbano

· Os próprios juízes manifestam seu preconceito por acharem um absurdo o casamento forçado, por lei, de Cassi com suas vítimas, “devido à diferença de educação, de nascimento de cor, de instrução”.

· Cassi vai se valer de Menezes, um homem de setenta anos, com sonhos frustrados de engenheiro, alcoólatra e profundamente honesto. Ele está tratando dos dentes de Clara, e Cassi pede-lhe que encomende um poema ao amalucado poeta Flores.

· Imagem de Castorina, esposa de Flores: a esposa é vista de forma condescendente pelo narrador, pelo fato de ser negra → narrativa tendenciosa.

· Flores fica indignado com o pedido de Menezes de um poema encomendado → Figura da Arte: inatingível conciliação entre a vida e a obra de arte

· O narrador defende claramente a igualdade de sexos, ao criticar a alienação feminina.

· Revelação de quem espalha o caderno sobre Cassi: oficial do exército, marido de Nair, filha da suicida.

· Menezes faz os versos ele mesmo e os entrega a Cassi. O conquistador pede-lhe que entregue os versos e uma carta a Clara, e oferece-lhe algum dinheiro: o narrador explicita como os indivíduos se rebaixam por força das circunstâncias (falta de dinheiro, convivência com tipos corruptos, falta de instrução corrompem Menezes).

· Menezes fica sendo o intermediário entre Cassi e Clara. Através de D.Margarida, amiga da família, Engrácia, mãe de Clara, toma conhecimento da “relação” entre os dois.

· Joaquim, estranhamente, não se opõe ao enlace de Clara com Cassi. Marramaque continua a criticar ferozmente Cassi, e esse trama seu assassinato.

· Marramaque é morto a pauladas e alçado a herói pelo narrador.

· Menezes, ao saber do assassinato, sente-se quase um cúmplice, pois este passara a Cassi as cartas em que Clara alertava-o da oposição de Marramaque à “união” dos dois.

· Cassi vende seus galos de briga e guarda o dinheiro para o caso de uma fuga

· Na cidade, Cassi encontra uma negra que havia sido sua primeira vítima, e fora expulsa da casa do sedutor, onde trabalhava, em adiantado estado de gravidez. Ela o humilha e revela que seu filho, com apenas dez anos, já se encontra detido (transcrição da fala popular nos diálogos).

· Clara analisa o próprio comportamento e amargura-se por ter se dado a Cassi e engravidado.

· Semi-demência de Menezes e sua morte ao lado do poeta Flores.

· Dr.Praxedes, um advogado simplório, revela eventualmente que Cassi mudara-se para São Paulo.

· D.Margarida, Engrácia e Clara vão falar com a mãe de Cassi, que as humilha.

· Ao final, acentua-se o caráter trágico da situação social vivida pela família de Clara. O narrador usa um tom moralista e cria um ambiente paranóico de perseguição contra os negros e mulatos, sempre vítimas do preconceito e da humilhação.

17 de novembro de 2007

Trechos selecionados de Jóias de família (Zulmira Ribeiro tavares)

Maria Bráulia Munhoz, no nono andar de seu apartamento no Itaim Bibi, prepara-se para o almoço. A mesa está posta para duas pessoas: ela e o sobrinho. A toalha sobre a mesa redonda, pequena, é de linho branco adamascado e no centro há um lago também redondo e pequeno, de espelho. Sobre a superfície de espelho pousa um cisne de Murano.

Maria Bráulia – de velhice definida mas idade não declarada, com movimentos seguros e rápidos, acompanhados de tapinhas, faz aderir ao rosto o seu segundo rosto, o “social”, de pele entre rosa e o marfim, boca e face rosadas. Os cílios com rímel espevitam o azul dos olhos e atiçam o amarelo pintado dos cabelos. Com o rosto social mais uma vez encenado, o outro, o estritamente particular, recua, como acontece todas as manhãs, e é esquecido imediatamente por sua dona. Um rosto que de tão pouco visto por terceiros adquire a mesma modéstia do corpo murcho, e assim, trazê-lo á luz do dia, sustentá-lo sobre o pescoço como se fosse a coisa mais natural do mundo ( o que vem aliás exatamente a ser), exibi-lo para algum outro, ainda que muito íntimo, como o sobrinho, lhe pareceria um ao da mais absoluta e indesculpável falta de pudor.

Julião Munhoz finalmente chama o elevador e logo mais se encontra pisando terra firme, o solo do Itaim-Bibi. Nove andares o separam do apartamento 91. longe está da pequena mesa redonda paralisada no ar, lá no alto; do cisne de Murano no centro, deslizando tão velozmente através dos muitos anos de fartura vividos por Maria Bráulia Munhoz, com o majestoso porte perfilando-se na superfície polida do lago de espelho, que nem parece sair do lugar. Longe está Maria Preta, que ora olha de baixo para cima, ora de cima para baixo, conforme as circunstâncias. Por isso seu rosto não se memoriza com facilidade e até nas fotografias dos álbuns da família Munhoz tem-se a dificuldade em fixá-lo (...).

As mentiras de Maria Bráulia, como as de todos bem-sucedidos e experimentados mentirosos, geralmente não são formadas de uma só peça, contêm vários elementos, e sob esse aspecto pode-se observar nelas alguma semelhança com os rubis falsos ou semi-falsos em montagens do tipo doublets e triplets.

(...) os que sofrem a ação da mentira, tanto quanto os que as inventam, mentem também para si mesmos e defendem-se dos efeitos devastadores da verdade inoculando em si próprios, regularmente, pequenas doses de ilusão.

Por que não usa a cópia, o anel com o rubi de imitação? Ah, bem, o anel de imitação nunca existira! Havia sido a maneira que o Munhoz arranjara para proteger uma gema tão rara. Acaso ela era mulher de andar com pedrinha de vidro colorido no dedo? Tinha graça! — E se com o correr dos anos a história sobre o anel de imitação falso caiu completamente no esquecimento, a existência de um anel verdadeiro com um puríssimo rubi sangue-de-pombo engastado, nunca. Tornou-se aos poucos uma gema lendária na crônica sobre as jóias da família.

As gemas raras devem ser engastadas nas jóias com o mesmo cuidado com que estas se engastam na linhagem de uma família, havia dito ainda o joalheiro Marcel para seus anfitriões um dia — quando jantavam apenas os três ao redor da pequena mesa redonda — olhando alternadamente do juiz Munhoz para o cisne de Murano.

É muito tarde. Várias cabeças rolaram. Umas fora da vida, outras nos travesseiros. Só a do cisne de Murano permanece erguida. A madrugada chega. As cortinas estão afastadas e de fora avança a luz branquicenta descendo na sala. Empresta ao cisne de Murano a qualidade macia do que é de carne e de penas ao mesmo tempo que lhe rouba a aparência de vida emprestada; tão descorado se acha quanto um frango de pescoço torcido sem pinga de sangue. Estarrece por afrontar as leias da natureza e os costumes dos homens. Um defuntinho de pé.

10 de novembro de 2007

trechos escolhidos de "Manuelzão"

O universo popular em Manuelzão

· Utilização de refrões, ditados, quadras, versos populares e da sabedoria do sertão mineiro

· Referência ao romanceiro de cordel: Romanço do Boi Bonito, Décima do Boi e do Cavalo

“E... era uma vez uma vaca Vitória: caiu no buraco — e começa outra estória... e era uma vez uma vaca Tereza: saiu do buraco — e a estória era a mesma...”

“Eh mundão! Quem me mata é deus, quem me come é o chão!”

“Alegria do pobre é um dia só: uma libra de carne e um mocotó.”

“Compadre, veja. Mais antes trabalhar domingo do que furtar segunda-feira. Mesmo digo. Aqui a gente olha a garapa ainda na cana.”

“— E a vida, seu Chico?, alguém pergunta, e ele responde: ‘— É isto que se sabe: é consolo, é desgosto, é desgosto, é consolo — é da casca, é do miolo.”

“Suspiro rompe parede/ rompe peito acautelado/ também rompe coração/ trancado e acadeado”

“Eu subi pro céu arriba/ Numa linha de pescar/ Fui perguntar Nossa Senhora/ se é pecado namorar”

“Travessei o São Francisco/ Montado numa cabaça/ Arriscando a minha vida/ Por um gole de cachaça”

“Esse boi que hei, é um Boi Bonito: muito branco ele é, fubá da alma do milho; do corvo o mais diferente, o mais perto do polvilho. Dos chifres, ele é pinheiro, quase nada torquesado. O berro é uma lindeza, o rasto bem encalçado. Nos verdes onde ele pasta, cantam muitos passarinhos. Das aguadas onde bebe, só se bebe com carinho. Muito bom vaqueiro é morto, por ter ele frenteado. Tantos que chegaram perto, tantos desaparecidos. Ele fica em pé e fala, melhor não se ter ouvido...”

ESTÓRIAS

“Festa devia de ser assim: o risonho termo e começo de tudo, a gente desmanchando tudo, até o feito com seu suor do trabalho de sempre; e sem precisar, depois de tornar a refazer. Que nem com as estórias contadas. Chegava na hora, a estória alumiava e se acabava. Saía por fim fundo, deixava um buraco.”

“As estórias — tinham amarugem e docice. A gente escutava, se esquecia de coisas que não sabia”.

“Mas, tinha lá alguma graça aquela estória de amor nessas gramas ressequidas, de um velhão no burro baio com uma bruaca assunga-a-roupa?”

“Até as mulheres choravam. Leonísia suavemente, Joana Xaviel de certo chorava. Essa estória ela não sabia, e nunca tinha escutado. Essa estória ela não contava. O Velho Camilo que amava. Estória !”

Epígrafe:

“O tear

o tear

o tear

o tear

quando pega a tecer

vai até o amanhecer

quando pega

a tecer

vai até ao

amanhecer...”

(Batuque dos Gerais)

2 de junho de 2007

Os melhores poemas de Alphonsus de Guimaraens

Os melhores poemas de Alphonsus de Guimaraens

Prof.Aloisio

Simbolismo (final do século XIX)

  1. estética baseada no subjetivo, no pessoal, na sugestão e no vago, no misteriosos e ilógico, na expressão indireta e simbólica
  2. o artista não deve dar nome ao objeto, nem mostrá-lo diretamente, mas sugeri-lo, evocá-lo pouco a pouco (Mallarmé)
  3. a arte como fonte de fortes experiências emocionais e como revelação do mistério do mundo
  4. poesia de sugestões e musicalidade, correspondências e inter-relações de sentidos
  5. o simbolismo é o resultado final de um desenvolvimento que se iniciou com o romantismo, com a descoberta da metáfora como a base da poesia e da exploração da psique humana
  6. mas o simbolismo repele o romantismo devido ao seu excesso de sentimentalismo, por isso volta-se para a exploração das imagens subconscientes e inconscientes
  7. poesia simbolista : surge do espírito irracional, oposta a toda interpretação lógica; correspondências criadas entre o concreto e o abstrato, o material e o ideal
  8. poesia voltada para o eu: o que importa são os estados da alma do poeta, por isso há atitudes anti-racionais e místicas, o tom idealista e religioso, a tendência ao isolamento = exploração do inconsciente através dos símbolos e das sugestões para compreender a vida através da intuição e do irracional
  9. as palavras poéticas transforma-se em símbolos de vivências místicas e sensoriais indizíveis, intraduzíveis, mas passíveis de ser evocadas e sugeridas por meio de metáforas, analogias e sinestesias
  10. aproveitamento de elementos musicais, tonais e rítmicos, e da cor (sinestesias)
  11. utilização de letras maiúsculas em substantivos comuns, para torná-los absolutos
  12. as manifestações metafísicas espirituais da poesia simbolista correspondem à negação da objetividade e do excesso de racionalismo do realismo

· atitude religiosa do simbolismo :

1. ênfase no mundo da beleza ideal

2. aproveitamento da liturgia — o conjunto dos elementos e práticas do culto religioso (missa, orações, cerimônias, sacramentos, objetos de culto) instituídos por uma Igreja ou seita religiosa

3. a prática da poesia simbolista assemelha-se ao estado de êxtase, contemplação e da oração

4. concepção mística da vida: conteúdo relacionado com o espiritual, o místico, o subconsciente

Na historiografia da literatura brasileira, o simbolismo ficou abafado pelo parnasianismo, que era plenamente aceito pela Academia, por se adequar à estética do realismo. Posteriormente, ele será aceito e a importância de Cruz e Alphonsus de Guimarães será legitimada.

A poesia simbolista de Alphonsus de Guimaraens (1870-1921)

A poesia, segundo o autor, tem a missão de conduzir-nos ao sublime

· Insistência nos mesmos temas do amor e da morte durante toda sua obra

· As cores funéreas (preto e roxo) não são mero artifício, e, sim, uma condição existencial básica

· A fé católica é também decorrente de seu ambiente vital: as cidades mineiras barrocas

· O amor e a morte aparecem como o único meio de se atingir a sublimação e de aproximar o poeta de Constança, a amada noiva, morta às vésperas do seu casamento, que lhe influenciará toda a produção poética

· Sublimação do sentimento amoroso na figura da Virgem Maria

· Constância constitui o fio condutor das visões oníricas, do tom elegíaco, das imagens ancestrais, individuais e coletivas, que perpassam toda a obra do poeta

Biograficamente, um episódio importante para entender sua poesia é a perda da amada Constança, filha de Bernardo Guimarães. Alphonsus nunca se conforma com a morte da jovem, que o separa, a ele que tinha a propensão para a mitificação, definitivamente do tempo atual. A partir deste episódio, tão traumático, o poeta se volta para o passado, que é o tempo de uma felicidade agora impossível. Sua vida transcorrerá sob o signo da morte e seus poemas serão um “evangelho do aqui-jaz”. A amada está na própria santa do altar, tão pálidas as faces das duas.

E é no centro do altar poético erguido por Alphonsus que esta mulher se encontra. A sua cor branca tem conexão com a lua – outra imagem recorrente em seus poemas. A luz lunar é fria, distante, solitária na noite. O poeta descobre nela a imagem da amada ausente e presente, bem de acordo com esta concepção fantasmagórica da existência. A lua também está relacionada à memória. Ela funciona como ponto de contato entre o ontem e o hoje, e mitiga a solidão e a saudade daqueles que se sentem presos a uma outra era. Um sentimento forte que percorre a poesia de Alphonsus de Guimaraens é o da necessidade de cultuar os mortos, de tirar-lhes do esquecimento. Assim, a lua é mais do que uma imagem que comparece em seus textos noturnos, é a própria essência do ato poético, por ser um símbolo da memória reunificadora. (http://www.revista.agulha.nom.br/msanches021.html)

· Além da morte, há um profundo interesse pelo noturno e pelo mistério da existência

· Retratação do tema da loucura, aproximando-a dos estados sublimes da vida

· Criação de uma atmosfera mística e litúrgica, em que abundam referências ao corpo morto, ao esquife, às orações, às cores roxa e negra, e ao sepultamento

· Símbolos fúnebres: pó, cal, cova, jazigo funeral

· Lua: aura, neve, luz, palidez, branco, sol, rosa branca, lírios

· Tentação(desejo) X Salvação (devoção) :

1. lábios vermelhos; olhar, beijo

X

2. oração, cruz, igreja, santos, altar, anjos, salmos, Jesus messiânico, hinos , céu; devoção a Santa Teresa de Jesus; escapulário, rosário, coroa

Principais poemas

A Catedral

Entre brumas ao longe surge a aurora,
O hialino orvalho aos poucos se evapora,
Agoniza o arrebol.
A catedral ebúrnea do meu sonho
Aparece na paz do céu risonho
Toda branca de sol.

E o sino canta em lúgubres responsos:
"Pobre Alphonsus! Pobre Alphonsus!"

O astro glorioso segue a eterna estrada.
Uma aurea seta lhe cintila em cada
Refulgente
raio de luz.
A catedral eburnea do meu sonho,
Onde os meus olhos tao cansados ponho,
Recebe a bencao de Jesus.

E o sino clama em lugebres responsos:
"Pobre Alphonsus! Pobre Alphonsus!"

Por entre lirios e lilases desce
A tarde esquiva: amargurada prece
Poe-se a luz a rezar.
A catedral eburnea do meu sonho
Aparece na paz do ceu tristonho
Toda branca de luar.

E o sino chora em lúgubres responsos:
"Pobre Alphonsus! Pobre Alphonsus!"

O céu e todo trevas: o vento uiva.
Do relâmpago a cabeleira ruiva
Vem acoitar o rosto meu.
A catedral ebúrnea do meu sonho
Afunda-se no caos do céu medonho
Como um astro que já morreu.

E o sino chora em lúgubres responsos:
"Pobre Alphonsus! Pobre Alphonsus!"

(http://www.revista.agulha.nom.br/msanches021.html)

O sino e seus badalos, presenças tão fortes nas cidades mineiras, levam a alma a um transe religioso, abolindo com seus sons a vida imediata.

Sendo um mecanismo cronológico, ele marca um tempo místico, cíclico, que se repete infinitamente. Alphonsus de Guimaraens explora este tema em “A catedral”, um de seus mais belos poemas, onde a mudança da paisagem vai sendo acompanhada pelas ressonâncias do sino, que se intensificam com o passar das horas, embora o refrão continue o mesmo. O poema é composto em quatro tempos: manhã, meio-dia, tarde e noite. Primeiro o sino canta, depois clama, chora e por fim geme a sua mensagem monótona, mas esta mudança se dá no receptor, comovido com a chegada da noite:E o sino geme em lúgubres responsos:

“Pobre Alphonsus! Pobre Alphonsus!” Há aqui um estribilho tão significativo quanto o do famoso poema “O corvo”, de Edgar Allan Poe, em que este animal responde às inquietações do poeta com a invariável frase “Nunca mais”, liquidando as ilusões humanas. Ao repetir o seu “Pobre Alphonsus!”, o sino está dizendo a mesma coisa, dirigindo-se a um interlocutor definido. É o declínio da condição humana visto na unidade de um dia.

Ismália

Quando Ismália enlouqueceu,
Pôs-se na torre a sonhar...
Viu uma lua no céu,
Viu outra lua no mar.

No sonho em que se perdeu,
Banhou-se toda em luar...
Queria subir ao céu,
Queria descer ao mar...

E, no desvario seu,
Na torre pôs-se a cantar...
Estava perto do céu,
Estava longe do mar...

E como um anjo pendeu
As asas para voar...
Queria a lua do céu,
Queria a lua do mar...

As asas que Deus lhe deu
Ruflaram de par em par...
Sua alma subiu ao céu,
Seu corpo desceu ao mar...

(http://www.revista.agulha.nom.br/msanches021.html)

A sua verdadeira cidade não está na terra, mas na geografia mítica dos símbolos siderais, continente das coisas eternas. É lá que o poeta quer residir e, nesse sentido, ele se considera um lunático. Toda a sua poesia está construída sobre esta consciência dolorosa da cisão, que só é anulada tragicamente. Este o drama de Ismália, que queria duas luas, sem saber que uma era apenas miragem. Fica aí representado o drama íntimo do próprio poeta, que se sente duplamente atraído por dois elementos distintos, numa equação que só pode ser resolvida com a morte, quando a parte terrena do ser libera a alma para seguir ao encontro desta cidade celeste.

Hão de Chorar por Ela os Cinamomos...

Hão de chorar por ela os cinamomos,
Murchando as flores ao tombar do dia.
Dos laranjais hão de cair os pomos,
Lembrando-se daquela que os colhia.

As estrelas dirão — "Ai! nada somos,
Pois ela se morreu silente e fria.. . "
E pondo os olhos nela como pomos,
Hão de chorar a irmã que lhes sorria.

A lua, que lhe foi mãe carinhosa,
Que a viu nascer e amar, há de envolvê-la
Entre lírios e pétalas de rosa.

Os meus sonhos de amor serão defuntos...
E os arcanjos dirão no azul ao vê-la,
Pensando em mim: — "Por que não vieram juntos?"

Trechos selecionados de O VENDEDOR DE PASSADOS (José Eduardo Agualusa)

O vendedor de passados (José Eduardo Agualusa)

1) Trecho da música “Acalanto para um rio”

Nada passa, nada expira

O passado é

Um rio que dorme

E a memória uma mentira

Multiforme

2) Sobre a Velha Esperança:

“Na minha opinião, é a coluna que sustenta essa casa” → ANGOLA

Félix ventura:

“Está cheio de vozes o meu barco.”

“Um barco (cheio de vozes) subindo o rio.”

3) Crítica à nova burguesia angolana:

“Falta a essas pessoas um bom passado, ancestrais ilustres, pergaminhos. Resumindo: um nome que ressoe a nobreza e a cultura.”

4) José Buchmann (Pedro Gouveia)

“Dói-me na alma um excesso de passado e de vazio.”

5) Osga

“Os meus sonhos são quase sempre mais verossímeis que a realidade.”

“Félix fala de sua infância como se realmente a tivesse vivido.”

6) Sobre o ofício de Felix Ventura

“Acho que aquilo que faço é uma forma avançada de literatura. (...) Também eu crio enredos, invento personagens, mas em vez de os deixar presos dentro de um livro dou-lhes vida, atiro-os pra realidade.”

“Crio enredos por ofício. Enfabulo tanto, ao longo do dia, e com tal entusiasmo, que por vezes chego à noite perdido no labirinto de minhas próprias fantasias.”

7) Memória

“A nossa memória alimenta-se, em larga medida, daquilo que os outros recordam de nós. Tendemos a recordar como sendo nossas as recordações alheias — inclusive as fictícias.”

“A memória é uma paisagem contemplada de um comboio em movimento.”

18 de maio de 2007

Nove noites_Bernardo Carvalho : roteiro de leitura

Nove Noites (Bernardo Carvalho)

  • “Isso é para quando você vier. É preciso estar preparado. Alguém terá que preveni-lo.Vai entrar numa terra em que a verdade e a mentira não têm mais os mesmos sentidos que o trouxeram até aqui”. (relato de Manoel Perna)
  • Ao início, já há a idéia do segredo como única herança, antevendo o final da narrativa.
  • “As histórias dependem antes de tudo da confiança de quem as ouve, e da capacidade de interpretá-las”.(Relato de Manoel Perna)
  • O relato inventado do engenheiro sobre uma suposta última carta deixada por Buell Quain a um suposto conhecedor dos verdadeiros motivos do suicídio.

A tentativa do autor de buscar a verdade, inventando-a. A ficção como a busca da verdade.

· Sete cartas visando deixar o mundo em ordem: para a orientadora Ruth Benedict; D.Heloisa Alberto Torres, diretora do Museu Nacional; Manoel Perna, engenheiro de Carolina; Capitão Ângelo Sampaio, delegado; Dr. Eric P. Quain, seu pai; reverendo Thomas Young, missionário instalado em Mato Grosso; ao cunhado Charles Kaiser.

· Relato jornalístico sobre vida e obra de Quain e sua família (dados precisos e esmiuçados)

· Início de suposições por parte do jornalista: estranha ansiedade nas cartas da mãe de Quain à diretora do museu

· Carta de Quain a D.Heloisa, sobre sua suposta infecção

· Segundo os índios que acompanhavam o etnólogo, não havia traços de doença física; antes, a protração era psicológica, desde que recebera a última carta de casa

· O autor incita o mistério da morte através de evidências curiosas, que dificilmente serão comprovadas

· Com base nas apurações jornalísticas, ficcionais ou não, o autor vai tecendo o relato de Perna sobre Quain.

Impressões sobre Buell

1. Para Perna, um sujeito aflito, transtornado, enigmático

2. Para o autor, segundo depoimentos e cartas, um sujeito que não gostava de mostrar o quão rico era, isolado, idealista, solitário, fechado

  • “Isso é para quando você vier”(Perna) / “Ninguém nunca me perguntou, e por isso também não precisei responder” (autor)

Identificação do autor com engenheiro lhe permite construir relato fictício

  • Até que ponto Quain conseguiu relativizar sua visão dos Trumai? (não gosta do contato físico com os índios, acha-os feios, critica seus costumes, desrespeita-os)
  • Mas Quain se identifica com os índios negros da ilha do Pacífico Sul, o que é um paradoxo: segundo relato de Perna, ele encontrou na cultura dos trumai a representação coletiva do desespero que vivia (auto-destruição)
    1. Identificação:Nos aproximamos das pessoas que gostaríamos que fossem como nós e daquelas como as quais gostaríamos de ser
  • Metalinguagem: “As minhas explicações sobre o romance eram inúteis. Eu tentava dizer que, para os brancos que não acreditam em deuses, a ficção servia de mitologia, era o equivalente dos mitos dos índios, e antes mesmo de terminar a frase, já não sabia se o idiota era ele ou eu”.
  • A metalinguagem é fundamental no livro pois os percalços da pesquisa precisam ser evidenciados para dar veracidade à ficcionalidade = verossimilhança
  • Citação de Drummond: cada um aplica o sentido dos versos a sua própria experiência acumulada
  • Segundo Perna, Buell não se conformava com sua expressão, na foto, de espanto diante do desconhecido
  • Perna: para Quain, “ a morte é um excesso que se anula” (saturação, desespero)
  • A investigação, ao estilo romance policial, para descobrir se o moribundo ao lado de seu pai no hospital seria o fotógrafo e amante da mulher de Buell.
  • A deliberação de escrever uma história ficcional e o medo de que a verdade viesse à tona depois do romance publicado.
  • O filho do fotógrafo em NY: a revelação de que seu verdadeiro pai teria morrido no coração do Brasil quando tentava voltar para conhecê-lo, segundo carta do fotógrafo.
  • Sua mãe seria a amante dos dois? A carta seria forjada? Estaria o fotógrafo livrando-se de uma responsabilidade?
  • A história de Quain está sujeita, como qualquer outra, a fatos ligados à memória, percepção seletiva e subjetividade. Portanto, ocorre uma reinterpretação, reinvenção.

O que está em jogo em Nove Noites:

    1. contínuo mistério
    2. vazio de respostas relacionadas ao isolamento
    3. busca de identidade
    4. desajustes sociais
    5. instabilidade psíquica
    6. motivos que levam um indivíduo ao suicídio










ps: “Há muitos modos de afirmar; há um só de negar tudo” (Machado de Assis)